25 de junho de 2017

Diário ANimado - Annecy 2017 - Dia VI (último dia)

Hoje vou falar sobre o meu último dia no Festival de Annecy 2017.

Não vi a sessão de encerramento, pois é para convidados, mas ela aconteceu no sábado mesmo, com sessões no domingo sobre os premiados. Então vamos lá!




Foram duas sessões de longas e uma de curta-metragem. 

Sessão de longas-metragens 1

In This Corner of the World

Direção : Sunao Katabuchi
País : Japão
Ano de produção: 2016
Duração : 02 h 09 mn
Técnica(s) utilizada(s) : 2D

A animação ao estilo tradicional japonês, inspirada no design mangá, então não há muito a dizer sobre o visual, sempre bem desenhado, fundo muito bem pintado e detalhado, com nada que pese negativamente na criação das imagens. Então vou à narrativa. A animação lembra o Cemitério dos Vaga-lumes (1988), de Isao Takahata. A história se passa em um momento difícil da história japonesa, um período que vai de antes a depois da 2a. Guerra Mundial. Suzie é uma jovem de Hiroshima, que deixa a família para se casar e viver com os pais do marido em outra cidade. O filme conta bem como era a região, as relações familiares, o respeito e a esperança dos japoneses em seu país. E o sofrimento, as perdas, a frustração com a derrota na guerra. Um filme pesado, apesar das cores sempre pastéis que aparecem na tela, mas bem feito. A história não é bonitinha.

Sessão de longas-metragens 2

Ethel and Ernest

Direção : Roger Mainwood
País : Reino Unido, Luxemburgo
Ano de produção: 2016
Duração : 01 h 34 mn
Técnica(s) utilizada(s) : 2D

Esta animação conta a história dos pais de Raymond Briggs (ilustrador britânico), Ethel e Ernest, duas pessoas comuns, da baixa classe trabalhadora de Londres, que se apaixonam, se casam, e passam por boa parte das mudanças sociais, culturas e políticas do século XX (mais ou menos, entre os anos de 1920 e 1960).

Como animação, é muito bem desenhada, como todos os detalhes arquitetônicos, de vestimenta, de objetos e decoração, que cobrem um período de tempo histórico considerável. Enquanto narrativa, foi bem elaborada, conseguindo mostrar as passagens de tempo e as mudanças de situação e pessoais de forma clara e sem ser maçante. Mas não há nada no filme, que não pudesse ter sido feito em live-action, mas é baseado na história em quadrinhos que Briggs, o filho, desenhou.

Sessão de Curtas 2

Zug nach Peace - Trem para a paz

Direção : Jakob Weyde, Jost Althoff
País : Alemanha
Ano de produção: 2016
Duração : 09 mn 52 s
Técnica(s) utilizada(s) : 2DTécnica(s) utilizada(s) : Stop motion com objetos, Desenho sobre papel, 2D, 3D

A animação trabalha com imagem live-action. Conta a história de um iraquiano que vive em Berlim, e no metrô, vai refletindo sobre a situação de seu país, e a dele, um estrangeiro em outro lugar. Bom filme, com intervenções gráficas nas imagens reais, e imagens animadas com visual de xilogravura, preto e branco.

Tesla : Lumière mondiale - Tesla Luz Mundial

Direção : Matthew Rankin
País : Canadá
Ano de produção: 2016
Duração : 08 mn 18 s
Técnica(s) utilizada(s) : Stop motion com bonecos, Pixilation, outras, Live-action

Outra animação que usa imagem live-action. Com a história real de Nikola Tesla que em 1905 pede dinheiro ao seu ex-mecenas para financiar a mais extraordinária invenção: a criação de uma fonte de energia em escala mundial. Um bom filme, que soube utilizar as imagens de forma referencialmente inteligente - com efeitos do cinema de avant-garde do início do século XX, uma vez que a própria história real se passa no mesmo período.

Pépé le morse - Vovô Morsa

Direção : Lucrèce ANDREAE
País : França
Ano de produção: 2017
Duração : 14 mn 53 s
Técnica(s) utilizada(s) : 2D

Animação muito interessante, conta a história de uma família que por razões religiosas da avó, vai à praia "visitar o avô", que já está morto, como se fossem a um cemitério.
A relação da família, a mãe e os quatro filhos, é bem conturbada, e acham que a avó está meio "caduca", mas cedem à sua vontade. Coisas estranhas e engraçadas acontecem na praia, misturando drama e surrealidade. A animação em desenho é utilizada para dar forma a esses momentos, com personagens bem concebidos.

MeTube 2: August Sings Carmina Burana

Direção : Daniel Moshel
País : Áustria
Ano de produção: 2016
Duração : 05 mn 41 s
Técnica(s) utilizada(s) : Live-action

É um clip animado sobre a música de Carmina Burana, cantada por performances de rua. As animações acontecem nas interferências e adições sobre a imagem live-action. Visualmente interessante, parece uma grande apresentação circense, que desaparece em segundos.

Adam

Direção : Veselin Efremov
País : Dinamarca
Ano de produção: 2016
Duração : 05 mn 53 s
Technique
Técnica(s) utilizada(s) : Ordinateur 3D

Animação 3D de ambiente e história sem esperança, mostra um homem/robô se soltando de uma estrutura para adaptação biônica, em um laboratório. Em termos de 3D, é muito bem feito na recriação de um ambiente irreal mas que parece imagem filmada. Em termos de narrativa visual é deprimente, representando bem a condição do personagem.

The Full Story - A história completa

Direção : Daisy Jacobs, Chris Wilder
País : Reino Unido
Ano de produção: 2017
Duração : 07 mn 30 s
Técnica(s) utilizada(s) : Stop motion com objetos, Pixilation, outras

O curta conta a história de Toby que vende a casa onde passou a infância. Fatos e situações de sua vida são mostradas através da animação com objetos de forma bem criativa e envolvente. Também tem uma narrativa introspectiva e reflexiva, mas é um bom filme e uma boa animação.

Nothing Happens - Nada Acontece

Direção : Uri Kranot, Michelle Kranot
País : Dinamarca, França
Ano de produção: 2017
Duração : 11 mn 49 s
Técnica(s) utilizada(s) : Desenho sobre papel, Fotocópia

A animação fala da inércia, pois, literalmente, nada acontece. Através de desenhos, aparece uma cena de pessoas que se colocam em pé, em um a planície de neve, até formarem uma, massa, pois ficam todos juntos. Essa cena é entrecortada pela das árvores, onde pousam os corvos.
Com predominância de branco, preto, azul escuro e ocre, a câmera passa pelas pessoas, mostra seus rostos, todos com olhos esbugalhados, meio que esperando por alguma coisa.

Sprawa Moczarskiego - Caso Moczarski

Direção : Tomasz Siwinski
País : Polônia
Ano de produção: 2016
Duração : 05 mn 15 s
Técnica(s) utilizada(s) : Pintura sobre vidro

Animação forte. Baseado em uma história real, do jornalista polonês Kazimierz Moczarski. Membro da Resistência durante a ocupação nazista da Polônia durante a Segunda Guerra Mundial e autor do livro "Conversas com o carrasco". Depois, ele foi perseguido, preso e torturado pelo governo comunista de Stalin, e reabilitado durante o período anti stalinista. Com predominância de preto, a pintura sobre vidro caiu muito bem na representação dessa história, com fluidez e dramaticidade. Muito boa animação, em todos os sentidos.

Nocna ptica - Pássaro noturno

Direção : Spela Cadez
País : Eslovênia, Croácia
Ano de produção: 2016
Duração : 08 mn 50 s
Técnica(s) utilizada(s) : Éléments découpés

Animação soturna, fechada. Mostra um animal - que pessoalmente me pareceu mais um tipo de gambá - estendido na estrada, à noite. Ouve-se um diálogo entre um homem e uma mulher sobre ele, mas os dois não aparecem na tela. Depois surge o personagem correndo, entrando em um carro e dirigindo por um tempo longo. A narração é sobre os pensamentos do personagem. Feita com recorte o curta é muito bem animado. Enquanto história fica aquela sensação de que ficou faltando algo -apesar de achar que a intensão era essa mesmo.


Impressão geral sobre o Festival:


É difícil resumir... mas vou tentar!

Destaco que escrevi o diário deste dia despois que soube da lista de premiados - foi divulgada no sábado mesmo - mas isso não interferiu no meu ponto de vista.


Alors,... como dizem os franceses... é um festival muito grande como já escrevi no primeiro dia. São 10mil pessoas (dados do festival) a mais na cidade, que tem uns 50mil habitantes. Então, é fácil entender que é difícil organizar e fazer com que tudo corra bem em todos os pontos de exibição e locais diversos ligados ao festival.


Mas também acontecem situação em que as características culturais se fazem presente. Mesmo ocorrendo alguns problemas causados por questões alheias ao participante, eles são pragmáticos. Assim, o problema acaba "sendo do" participante, pois ele vai ter que resolver sozinho.

Agora, um elogio: uma coisa muito legal é a quantidade de longas-metragens em exibição: nove em competição de 11 fora de competição! Infelizmente só tive como assistir a um deles...snif...

No geral, eu assisti a três sessões que achei muito boas - a Perspectivas 1 e as Sessões de Curtas-metragens em Competição 2 e 3. Mas não vi nenhum filme que eu pudesse dizer, "nossa, que animação!". O nível técnico de todas é muito equilibrado.

Em termos narrativos é evidente o momento de desesperança e de crítica ao modelo de vida e sociedade atuais. Assim como ficou claro a postura política do festival, na afirmação da liberdade de expressão, política, sexual, étnica, cultural, etc.

Comentando sobre os premiados do Festival, onde só posso falar do que eu vi - longas e curtas-metragens.

Obviamente eu tenho uma visão diferente da lista de premiados oficial. Acho que "Lu Over the Wall", para primeiro e mais importante prêmio de longa-metragem (Cristal), é fraco - comentei sobre ele no segundo dia. Tudo bem que ele usa a animação de formas mais solta, apesar de ser oriental, e com design de manchas para representar as lembranças. Mas isso, para mim, é pouco para levar o prêmio. Acho que ele tem que ser "bom" no conjunto. Enquanto história, “Loving Vincent”, “In this Corner of the World”, “Big Fish & Begonia”, ou mesmo “Teheran Taboo” são muito mais fortes. Os dois primeiros foram premiados respectivamente, com prêmio do público (realmente, eu ouvi muitos comentários sobre o filme, em filas e nas ruas da cidade) e do juri.

Quanto à premiação dos Curtas, eu também não acho que “Mon Börda” (The Burden) fosse "o melhor" para o primeiro prêmio, apesar de ser uma boa animação. Acho que “Caso Moczarski” (que vi no sábado), “Empty Space”, “After All”, “Kötö Kiz” (ganhou prêmio do juri), “Splendida Moaert Accident” (ganhou o prêmio de primeira obra) e mesmo “Manivald”, ficariam melhor como premiado principal.

Mas como se diz, "cabeça de jurado é caixa de Pandora..." E são muitos os motivos que levam uma produção a ser premiada, e isso ocorre em qualquer festival – o que nem sempre é evidente para quem somente assiste aos filmes.

Bem, eu me despeço esperando ter conseguido passar para vocês um pouco do que eu vi e vivi em Annecy, e ter 'animado" o amor de vocês por essa Arte.


Abraço a todos e muito obrigada pelo interesse! ;)