Hoje vou falar sobre o meu último dia no Festival de Annecy 2017.
Não vi a sessão de encerramento, pois é para convidados, mas ela
aconteceu no sábado mesmo, com sessões no domingo sobre os premiados. Então vamos lá!
Foram duas sessões de longas e uma de curta-metragem.
Sessão de longas-metragens 1
In This Corner of the World
Direção
: Sunao Katabuchi
País :
Japão
Ano de produção:
2016
Duração
: 02 h 09 mn
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D
A animação ao estilo tradicional japonês, inspirada no design mangá,
então não há muito a dizer sobre o visual, sempre bem desenhado, fundo muito
bem pintado e detalhado, com nada que pese negativamente na criação das
imagens. Então vou à narrativa. A animação lembra o Cemitério dos Vaga-lumes
(1988), de Isao Takahata. A história se passa em um momento difícil da história
japonesa, um período que vai de antes a depois da 2a. Guerra Mundial. Suzie é
uma jovem de Hiroshima, que deixa a família para se casar e viver com os pais
do marido em outra cidade. O filme conta bem como era a região, as relações
familiares, o respeito e a esperança dos japoneses em seu país. E o sofrimento,
as perdas, a frustração com a derrota na guerra. Um filme pesado, apesar das
cores sempre pastéis que aparecem na tela, mas bem feito. A história não é
bonitinha.
Sessão de longas-metragens 2
Ethel and Ernest
Direção : Roger Mainwood
País : Reino Unido, Luxemburgo
Ano de
produção: 2016
Duração
: 01 h 34 mn
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D
Esta animação conta a história dos pais de Raymond Briggs (ilustrador
britânico), Ethel e Ernest, duas pessoas comuns, da baixa classe trabalhadora
de Londres, que se apaixonam, se casam, e passam por boa parte das mudanças
sociais, culturas e políticas do século XX (mais ou menos, entre os anos de
1920 e 1960).
Como animação, é muito bem desenhada, como todos os detalhes
arquitetônicos, de vestimenta, de objetos e decoração, que cobrem um período de
tempo histórico considerável. Enquanto narrativa, foi bem elaborada,
conseguindo mostrar as passagens de tempo e as mudanças de situação e pessoais
de forma clara e sem ser maçante. Mas não há nada no filme, que não pudesse ter
sido feito em live-action, mas é baseado na história em quadrinhos que Briggs,
o filho, desenhou.
Sessão de Curtas 2
Zug nach Peace - Trem para a paz
Direção
: Jakob Weyde, Jost Althoff
País : Alemanha
Ano de
produção: 2016
Duração
: 09 mn 52 s
Técnica(s) utilizada(s) : 2DTécnica(s) utilizada(s) : Stop motion com
objetos, Desenho sobre papel, 2D, 3D
A animação trabalha com imagem live-action. Conta a história de um
iraquiano que vive em Berlim, e no metrô, vai refletindo sobre a situação de
seu país, e a dele, um estrangeiro em outro lugar. Bom filme, com intervenções
gráficas nas imagens reais, e imagens animadas com visual de xilogravura, preto
e branco.
Tesla :
Lumière mondiale - Tesla Luz Mundial
Direção
: Matthew Rankin
País :
Canadá
Ano de
produção: 2016
Duração
: 08 mn 18 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Stop motion com bonecos, Pixilation, outras, Live-action
Outra animação que usa imagem live-action. Com a história real de Nikola
Tesla que em 1905 pede dinheiro ao seu ex-mecenas para financiar a mais
extraordinária invenção: a criação de uma fonte de energia em escala mundial.
Um bom filme, que soube utilizar as imagens de forma referencialmente
inteligente - com efeitos do cinema de avant-garde do início do século XX, uma
vez que a própria história real se passa no mesmo período.
Pépé le morse - Vovô Morsa
Direção : Lucrèce ANDREAE
País :
França
Ano de
produção: 2017
Duração
: 14 mn 53 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D
Animação muito interessante, conta a história de uma família que por
razões religiosas da avó, vai à praia "visitar o avô", que já está
morto, como se fossem a um cemitério.
A relação da família, a mãe e os quatro filhos, é bem conturbada, e
acham que a avó está meio "caduca", mas cedem à sua vontade. Coisas
estranhas e engraçadas acontecem na praia, misturando drama e surrealidade. A
animação em desenho é utilizada para dar forma a esses momentos, com
personagens bem concebidos.
MeTube 2: August Sings Carmina Burana
Direção : Daniel Moshel
País : Áustria
Ano de produção: 2016
Duração : 05 mn 41 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Live-action
É um clip animado sobre a música de Carmina Burana, cantada por
performances de rua. As animações acontecem nas interferências e adições sobre
a imagem live-action. Visualmente interessante, parece uma grande apresentação
circense, que desaparece em segundos.
Adam
Direção : Veselin Efremov
País : Dinamarca
Ano de
produção: 2016
Duração
: 05 mn 53 s
Technique
Técnica(s)
utilizada(s) : Ordinateur 3D
Animação 3D de ambiente e história sem esperança, mostra um homem/robô
se soltando de uma estrutura para adaptação biônica, em um laboratório. Em
termos de 3D, é muito bem feito na recriação de um ambiente irreal mas que
parece imagem filmada. Em termos de narrativa visual é deprimente,
representando bem a condição do personagem.
The Full Story - A história completa
Direção
: Daisy Jacobs, Chris Wilder
País : Reino
Unido
Ano de
produção: 2017
Duração
: 07 mn 30 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Stop motion com objetos, Pixilation, outras
O curta conta a história de Toby que vende a casa onde passou a
infância. Fatos e situações de sua vida são mostradas através da animação com
objetos de forma bem criativa e envolvente. Também tem uma narrativa
introspectiva e reflexiva, mas é um bom filme e uma boa animação.
Nothing
Happens - Nada Acontece
Direção
: Uri Kranot, Michelle Kranot
País :
Dinamarca, França
Ano de
produção: 2017
Duração
: 11 mn 49 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Desenho sobre papel, Fotocópia
A animação fala da inércia, pois, literalmente, nada acontece. Através
de desenhos, aparece uma cena de pessoas que se colocam em pé, em um a planície
de neve, até formarem uma, massa, pois ficam todos juntos. Essa cena é
entrecortada pela das árvores, onde pousam os corvos.
Com predominância de branco, preto, azul escuro e ocre, a câmera passa
pelas pessoas, mostra seus rostos, todos com olhos esbugalhados, meio que esperando
por alguma coisa.
Sprawa Moczarskiego - Caso Moczarski
Direção : Tomasz Siwinski
País :
Polônia
Ano de
produção: 2016
Duração
: 05 mn 15 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Pintura sobre vidro
Animação forte. Baseado em uma história real, do jornalista polonês
Kazimierz Moczarski. Membro da Resistência durante a ocupação nazista da
Polônia durante a Segunda Guerra Mundial e autor do livro "Conversas com o
carrasco". Depois, ele foi perseguido, preso e torturado pelo governo comunista
de Stalin, e reabilitado durante o período anti stalinista. Com predominância
de preto, a pintura sobre vidro caiu muito bem na representação dessa história,
com fluidez e dramaticidade. Muito boa animação, em todos os sentidos.
Nocna ptica - Pássaro noturno
Direção
: Spela Cadez
País : Eslovênia,
Croácia
Ano de
produção: 2016
Duração
: 08 mn 50 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Éléments découpés
Animação soturna, fechada. Mostra um animal - que pessoalmente me
pareceu mais um tipo de gambá - estendido na estrada, à noite. Ouve-se um
diálogo entre um homem e uma mulher sobre ele, mas os dois não aparecem na
tela. Depois surge o personagem correndo, entrando em um carro e dirigindo por
um tempo longo. A narração é sobre os pensamentos do personagem. Feita com
recorte o curta é muito bem animado. Enquanto história fica aquela sensação de
que ficou faltando algo -apesar de achar que a intensão era essa mesmo.
É difícil resumir... mas vou tentar!
Destaco que escrevi o diário deste dia despois que soube da lista de
premiados - foi divulgada no sábado mesmo - mas isso não interferiu no meu
ponto de vista.
Alors,... como dizem os franceses... é um festival muito grande como já escrevi
no primeiro dia. São 10mil pessoas (dados do festival) a mais na cidade, que
tem uns 50mil habitantes. Então, é fácil entender que é difícil organizar e
fazer com que tudo corra bem em todos os pontos de exibição e locais diversos
ligados ao festival.
Mas também acontecem situação em que as características culturais se
fazem presente. Mesmo ocorrendo alguns problemas causados por questões alheias ao
participante, eles são pragmáticos. Assim, o problema acaba "sendo
do" participante, pois ele vai ter que resolver sozinho.
Agora, um elogio: uma coisa muito legal é a quantidade de
longas-metragens em exibição: nove em competição de 11 fora de competição!
Infelizmente só tive como assistir a um deles...snif...
No geral, eu assisti a três sessões que achei muito boas - a
Perspectivas 1 e as Sessões de Curtas-metragens em Competição 2 e 3. Mas não vi
nenhum filme que eu pudesse dizer, "nossa, que animação!". O nível
técnico de todas é muito equilibrado.
Em termos narrativos é evidente o momento de desesperança e de crítica
ao modelo de vida e sociedade atuais. Assim como ficou claro a postura política
do festival, na afirmação da liberdade de expressão, política, sexual, étnica,
cultural, etc.
Comentando sobre os premiados do Festival,
onde só posso falar do que eu vi - longas e curtas-metragens.
Obviamente eu tenho uma visão diferente da lista de premiados oficial.
Acho que "Lu Over the Wall", para primeiro e mais importante prêmio
de longa-metragem (Cristal), é fraco - comentei sobre ele no segundo dia. Tudo
bem que ele usa a animação de formas mais solta, apesar de ser oriental, e com design
de manchas para representar as lembranças. Mas isso, para mim, é pouco para
levar o prêmio. Acho que ele tem que ser "bom" no conjunto. Enquanto
história, “Loving Vincent”, “In this Corner of the World”, “Big Fish &
Begonia”, ou mesmo “Teheran Taboo” são muito mais fortes. Os dois primeiros foram premiados respectivamente, com prêmio do público
(realmente, eu ouvi muitos comentários sobre o filme, em filas e nas ruas da
cidade) e do juri.
Quanto à premiação dos Curtas, eu também não acho que “Mon Börda” (The
Burden) fosse "o melhor" para o primeiro prêmio, apesar de ser uma
boa animação. Acho que “Caso Moczarski” (que vi no sábado), “Empty Space”, “After
All”, “Kötö Kiz” (ganhou prêmio do juri), “Splendida Moaert Accident” (ganhou o
prêmio de primeira obra) e mesmo “Manivald”, ficariam melhor como premiado
principal.
Mas como se diz, "cabeça de jurado é caixa de Pandora..." E
são muitos os motivos que levam uma produção a ser premiada, e isso ocorre em
qualquer festival – o que nem sempre é evidente para quem somente assiste aos
filmes.
Bem, eu me despeço esperando ter conseguido passar para vocês um pouco
do que eu vi e vivi em Annecy, e ter 'animado" o amor de vocês por essa
Arte.
Abraço a todos e muito obrigada pelo interesse! ;)