Antes de falar
mais sobre os filmes no meu quinto dia de diário animado, vou dar minha impressão sobre a cidade de Annecy.
É uma cidade no
meio da França, situada no lado leste do país. É bem mais perto de Genebra que de
Paris! Sua bandeira, inclusive parece a bandeira da Suíça, sendo que os braços
da cruz branca de Annecy, dividem a bandeira em quatro quadrados vermelhos.
No verão, como
agora, é bem quente: mais de 30 graus. E no inverno é frio. É aos pés das
cadeias de montanhas onde fica o Mont Blanc – aquele “das canetas”.
Tem um lago lindo,
de águas literalmente cristalinas, quase inacreditável! Dá vontade de voltar em
outro momento só para curtir a cidade - pois isso eu não fiz, na correria de
assistir às sessões.
Bem, vamos a elas!
Foram duas sessões de curtas e uma de longa-metragem.
Sessão Curtas Off-Limits
É uma sessão “reservada aos curtas-metragens com foco na exploração, na inovação
e na experimentação”. Quase todos são não-narrativos, então vou me ater a uma pequena descrição e impressão sensorial do que vi.
É uma sessão “reservada aos curtas-metragens com foco na exploração, na inovação
e na experimentação”. Quase todos são não-narrativos, então vou me ater a uma pequena descrição e impressão sensorial do que vi.
Cinéma Emek, Cinéma Labour, Cinéma Travail - Cinema Emek, Cinema Lavoura,
Cinema Trabalho
País: France, Turquia
Ano de produção: 2016
Duração : 05 mn 15 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D, 3D
É uma animação que mostra como era o grande cinema Emek, em Istambul, que
foi demolido em 2010. Ele começa com o teto da sala principal do cinema sendo
desenhado por linhas que correm e montam todos os detalhes arquitetônicos do
local. Era um ambiente grande e bonito. Como animação, pela própria proposta
descritiva, acaba sendo um pouco cansativo.
Direção : Siegfried A. FRUHAUF
País: Austria
Ano de produção: 2016
Duração : 05 mn 30 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Outras
O curta tem uma proposta filosófica: a luta entre o caos e a ordem.
Visualmente vê-se – sendo bem simplista – várias imagens com quadrados brancos
e pretos, de vários tamanhos, que se sobrepõem uns aos outros. Essa variação
acontece em sincronia com a música, em frequências diferentes. Na mais intensa,
têm-se a impressão de que se está olhando uma luz estroboscópica. Achei um
pouco longo.
Direção : Chris SHEPHERD
País: França, Reino Unido
Ano de produção: 2016
Duração : 08 mn 26 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D, Pixilation, Rotoscopia,
Outras
Trabalhando com uma mistura de técnicas, o curta mostra a agonia e o
sentimento de injustiça e vingança de um homem condenado por um crime que não
cometeu. Através de imagens em live-action trabalhadas com várias
interferências, a narração vai contando os pensamentos do personagem. O filme
reflete a agonia da situação.
Overlook - Ignorar
País: Finlândia
Ano de produção: 2017
Duração : 05 mn 42 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 3D
Esta animação se inicia com uma cena parada, de uma nobre sala em estilo clássico,
como se fosse feita de acrílico – é modelada em 3D. E começa a escorrer tinta
vermelha pelas paredes, que cobre tudo. E isso ocorre algumas vezes. Também tem
uma proposta filosófica. Mostrar uma ruptura espaço-tempo, e um certo horror.
Particularmente, achei longo para a proposta.
Direção : Hadrien dit Bhopal Bertuit
País: França
Ano de produção: 2016
Duração : 06 mn 35 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Desenho sobre papel
Através de diversas fotografias, é contada a história de alguém, seguida
de uma narração. As fotos são centrada na tela. Estas então são pintadas de
forma a tomar toda a tela com uma imagem completa. Proposta interessante,
visualmente agradável, é praticamente documental.
Dix puissance moins quarante-trois secondes – Dez forças menos quarenta e
três segundos
País: França
Ano de produção: 2016
Duração : 13 mn 57 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Ordinateur 3D,
Pixilation
Este curta-metragem trabalha a partir de imagem filmada slow-motion, e 3D
– o homem e o universo – com trilha sonora própria, como se fosse um som
aberto, durante todo o curta. A narração vai refletindo sobre a questão do
tempo da vida, do instante, da finitude.
Foi a animação que ganhou o prêmio da categoria.
Foi a animação que ganhou o prêmio da categoria.
Direção : Stuart POUND
País: Reino Unido
Ano de produção: 2016
Duração : 02 mn 11 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D
A animação é criada a partir de imagens do filme "L'Avventura"
(1960), de Michelangelo Antonioni, especificamente, com as imagens de Monica
Vitti. Dividindo a tela em 10 partes, as cenas do filme se passam de forma
sequencial. O que dá um resultado e um movimento geral bem bonito e interessante.
Lembram o flipbook e o efeito de caleidoscópio.
Direção : Dennis Tupicoff
País: Australia
Ano de produção: 2017
Duração : 10 mn 48 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D, Photos, Rotoscopia, Live-action
É um curta introspectivo, em preto e branco, de um homem que reflete
sobre sua vida, desde a infância através de suas fotografias. A narração vai
ancorando e dando sentido às imagens. Um pouco longo para o tipo de proposta.
Direção : Thomas Corriveau
País: Canada
Ano de produção: 2016
Duração : 06 mn 45 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Desenho sobre papel, Rotoscopia
Outra animação em preto e branco, que aborda a questão da guerra e da
violência. Inspirada nas gravuras Os Desastres da
Guerra (1810-1815), de Francisco de Goya, mostra
dois personagens que se agridem, numa violência hipnótica.
Direção : Boris Labbé
País: França
Ano de produção: 2016
Duração : 07 mn 45 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D, Ordinateur 3D,
Photos
A animação mostra em 3D a possibilidade de movimentação do plano
terrestre, com a criação e alteração de montanhas. É bem atrativo, com trilha
sonora coerente com as ações, mas um pouco longo demais, o que “quebra” a
intensidade das imagens.
Direção : Lei Lei, Thomas Sauvin
País: China
Ano de produção: 2016
Duração : 04 mn 52 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Desenho sobre papel, 2D
Os artistas
criaram essa animação a partir de 1168 fotografias em preto e branco achadas em
mercados de pulgas chineses. Através das pinturas dessas fotos, eles se
perguntam sobre a vida dessas pessoas. Proposta envolvente e visualmente
alegre.
Sessão de Curtas 4
Direção : Sergiu Negulici
País: Romênia
Ano de produção: 2016
Duração : 15 mn 05 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Stop motion com objetos,
Desenho sobre papel, 2D, 3D
Em uma loja de antiguidades, um homem encontra uma carta de amor de 70
anos, atrás de um desenho. Ele começa a procurar o autor e “viaja” por momentos
importantes da história do século XX. Muito bonita, atrativa. Pelas metáforas
que cria e pelo ambiente. A passagem de tempo acontece dentro de um trem. Como
se o personagem andasse dentro deste, passando pelos vagões e pelo tempo. Os
personagens são como bonecos feitos de papel. Vale à pena assistir.
Direção : Daria Kopiec
País: Polônia
Ano de produção: 2016
Duração : 02 mn 35 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Massinha
Fazendo uso de bonecos, a animação aborda a questão da atratividade dos
corpos. Mas não em “envolveu”.
Direção : Michaela Müller
País: Croácia, Suiça
Ano de produção: 2017
Duração : 10 mn 34 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Peinture sur verre
Através da pintura sobre vidro, de forma que a direção das largas
pinceladas vão formando as imagens, a animação vai mostrando diversas situações
que acontecem em um aeroporto. Imagem inteligente, pois até pela situação,
sempre há uma correria, a utilização das pinceladas reforça a ligeireza das
ações. Mas achei que se fosse mais curta, como narrativa, seria melhor.
Direção : Laurène Braibant
País: França
Ano de produção: 2017
Duração : 09 mn 41 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D
Através do desenho caricato, o curta conta a história de um homem muito
grande (ele é um ogro) que em um restaurante, não para de comer. Assim, ele
assusta as pessoas, mostrando seu verdadeiro eu. Lembra o filme O Sentido da
Vida (1983), de Monty Python. O visual é sinuoso, com linhas finas e colorido
aquarelado. Personagens e cenário se movem de acordo com a cena, e isso cria um
efeito atraente às imagens do filme.
Direção : Izibene Oñederra, Isabel Herguera
País: Espanha
Ano de produção: 2016
Duração : 07 mn 10 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Desenho sobre papel, 2D,
Outras
Animação surreal, do tipo que te deixa com uma interrogação. Começa com
um desenho de traços finos, colorido à caneta e aquarela, com predominâncias de
brancos de verdes. A cena de uma van que chega a um condomínio de prédios, e o
entregador vai fazer uma entrega. Mas em um dos apartamentos, há uma senhora
com seu gato preto. O visual é totalmente diferente: traços grossos,
displicentes, azuis, vermelhos, com predominância de preto. Surgem diversas
cenas de guerra, elementos africanos, cemitério... Ao final, o entregador leva
uma caixa... mas não vou contar o resto.
Direção : Cloud Yang
País: China
Ano de produção: 2017
Duração : 14 mn 16 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Desenho sobre papel, 2D
Desenho muito bonito, colorido, e bem oriental. Metafórico, o curta conta
a história de tipo de rito de passagem. A relação homem-natureza através de
belas imagens. Muito bem animado, poderia ser mais curto, isso daria mais força
à história.
Direção : Paul WENNINGER, Susan YOUNG
País: Austria
Ano de produção: 2017
Duração : 02 mn 47 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D, Pixilation
A animação fala também da finitude da vida, através de imagens da vida
cotidiana e da vida de uma cidade. Com imagens em Pixilation de Viena, o filme
mostra com interferências em desenho, a morte sempre presente. É curto, e por
isso perfeito na proposta.
Direção : Ayce Kartal
País: França, Turquia
Ano de produção: 2017
Duração : 07 mn 59 s
Técnica(s)
utilizada(s) : Desenho sobre papel
Animação forte. Baseado em uma história real, mostra uma menina que conta
em narrativa seus pensamentos e momentos de vida, enquanto as imagens oscilam
entre suas lembranças boas e ruins. Com desenhos correspondentes, “fofos”,
infantis, coloridos e grotescos, fortes, medonhos. Fica claro o ataque a
menina, mas de forma indireta, pela conclusão do público. Muito boa.
Direção : Alessandro Novelli
País: Espanha
Ano de produção: 2017
Duração : 07 mn 53 s
Técnica(s)
utilizada(s) : 2D
E outro filme filosófico. Através de uma viagem interior, uma mulher se
questiona sobre a vida e o sentido das coisas. Com imagem em traços em branco e
fundo preto, várias situações metafóricas e surreais vão se sucedendo com a
narrativa dos pensamentos da personagem, onde ela mesma perpassa por esses
ambientes. O texto é muito bom, mas como animação, é o mesmo caso: poderia ser
um pouco menos longa.
Sessão de longas-metragens 2
Direção : Ali Soozandeh
País: Alemanha
Ano de produção: 2017
Duração : 01 h 36 mn
Técnica(s)
utilizada(s) : Rotoscopia
O filme conta várias histórias pessoais dentro de um bom roteiro, sem
final feliz. É um bom filme, participou do Festival de Cannes, e é claramente
uma crítica à sociedade iraniana. Mostra a dura vida das mulheres – apesar de
lá, elas poderem estudar – que precisam de uma aprovação por escrito do marido (ou
pai) para tudo, inclusive trabalhar fora. Fala sobre as drogas, o sexo, a
corrupção, a falta de esperança, etc. Por essa razão, o título: coisas que não
se falam, coisas proibidas. É uma produção alemã de diretor iraniano.
Quanto ao visual, é de linhas retas grossas e com contrastes de cor e de
claro-escuro. Não há como não se lembrar de Valsa com Bashir (2008), outro
drama sobre o Oriente Médio. Porém, há vários momentos do filme em que a
“rotoscopia” não parece rotoscopia, mas efeito de filtro de algum software. Isso
“me tirou” do filme. É imagem real. E quando aparece o gato preto (que vive nos
arredores do prédio onde se passa boa parte da história), há uma “briga”, pois
o gato foi animado, não muito bem, em 3D.
Em termos de “ortodoxia” sobre o uso da animação para se contar certas
histórias, realmente não há nada que “justifique” o uso da rotoscopia ou
qualquer outra técnica animada, ao invés de live-action. Porém o diretor defende a utilização da rotoscopia pois, queria falar de uma realidade do país, mas não
tinha como filmar lá, então foi uma boa forma de representar a história, o mais
fiel possível à imagem real.
Resumo da ópera:
Mais um dia de filmes que refletem a falta de esperança que impera nos
nossos dias. Em termos de criatividade,
não vi nada “maravilhoso”, mas uma tendência a se misturar técnicas. O digital,
apesar da aura tecnicista em termos de “máquina”, de visual e técnico, matemático,
também carrega “um bocado” de inventividade. A experimentação dessas novas
formas de “fazer”, mescladas à forma tradicional, estão em alta.